quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

A ligação

O telefone toca e com a ajuda do identificador de chamadas ela vê que é ele.

Ela atende exatamente sabendo o rumo que o assunto irá tomar.

Não tem problema, não faz a menor importância o que ele dirá. Ela só pensa em como a noite pode vir a terminar.

Eles se conheceram há alguns anos, na adolescência, e de tempo em tempo se encontram com o pretexto de por o papo em dia.

Ela responde com um ar sedutor as perguntas que ele faz e como em um ballet bem ensaiado, a conversa termina exatamente como ela imaginara acontecer.

As horas passam e eles se encontram. Ele a olha como um olhar carente, pedindo colo e carinho. Já ela, só o enxerga como o belo homem que é.

Ele está cansado de sexo por sexo, de ficar por ficar e ver nela, aquela moça que conheceu novinha e cheia de sonhos, a oportunidade de sossegar.

Ela está cansada de insistir e tentar, de apostar e errar.

O jantar é maravilhoso, o vinho acentua o paladar.

A música esquenta delicadamente a troca de olhares.

Ele pensa no que fazer para levá-la para a cama.

Ela pensa em quanto tempo ficarão ali até chegarem à cama.

E com a habilidade sutil de chegar exatamente ao ponto que se quer, ela finalmente chega ao lugar que não parou de pensar desde o primeiro instante que atendeu ao telefone.

Naquele momento, o pensar e o imaginar não faziam mais sentido. Tudo estava ali, diante dos os olhos e ao alcance das mãos. De maneira rápida, voraz e intensa os corpos se despiram. Em meio a mãos, peitos, pernas, coxas, suor, mordidas, arranhões, tesão, carícias e beijos ninguém se lembrava mais do que queria.

O desejo era ser cada vez mais intenso, ir cada vez mais fundo, mais forte. Sem se importar com sentimentos, só com o prazer, só com o gozo do momento.

Bom?

É claro que foi. Com eles nunca acontecia diferente. Se tinha algo que eles faziam bem era dar prazer um ao outro.

Ele, cansado, satisfeito e extasiado, só pensava em como tê-la além daquela noite.

Ela, refeita, satisfeita e animada só pensava: Ele nunca passará de uma boa noitada.

Eles se vestiram, agiram como um perfeito casal.

Ele a deixou em casa, a beijou no rosto e disse: “Eu te ligo amanhã!”.

Ela saiu do carro, o beijou e disse: “No amanhã, a gente pensa amanhã”.

Não ententendo a resposta dela, ele rebate: “Desta vez vou ligar mesmo!”.

Ela finaliza: “Não me importo se a ligação virá amanhã ou daqui há 6 meses. Somos bons exatamente por não termos compromisso”.

Com um sorriso no rosto ele concorda.

Com um sorriso no rosto ela se renova.

Hoje acordei mais triste

Hoje acordei mais triste. Acordei mais apática, mais distraída, mais perdia e desnorteada. Acordei sentindo falta de coisas, de pessoas e de lugares. Acordei com um sentimento de ausência. Pareceu-me que até as batidas do meu coração estavam querendo me abandonar, estavam descompassada beirando uma disritmia.
Na verdade, dizer que acordei é errado, o mais adequado seria dizer que abri os olhos e me movimentei. Não sentia, não falava, não queria nada, apenas desejei cumprir minhas obrigações e fechar os olhos novamente. Tive, por um momento, a remota ideia de que se eu voltasse a fechar os olhos poderia, em seguida, de fato acordar para a vida.
Quem sabe, ao fechar meus olhos, eu volte a enxergar as cores e a sentir algo diferente da dor?
Quem sabe um sono profundo e tranquilo faça com que eu pare de sentir pena de mim?
Pena do enorme tempo que eu perco tentando me entender, tentando entender os outros, tentando conquistar coisas, pessoas e lugares. Pena do vazio que trago no coração, da ausência cortante dos sentimentos quentes, calorosos e excitantes. Pena desta insatisfação tão intrínseca ao meu ser, tão enraizada, tão profunda e tão presente.
Muitas das vezes cheguei a acha essa insatisfação um combustível, algo que me movesse, que me estimulasse a sentir-me motivada para seguir em frente. Hoje já tenho dúvidas quanto a isso.
Sei que este combustível me move, mas digamos que ele seja muito agressivo ao meio ambiente e esteja ao pouco matando tudo a sua volta.
Do que vale o dinheiro, o que você sabe, o que você conhece, o que você fez ou quer fazer e o que você tem, se você não é capaz de amar, aceitar e perdoar?
Hoje acorde mais triste, mais vazia de sentimentos, mais seca de esperança, mais frustrada com o fracasso, mais relutante com o perdão, mais severa com a aceitação e mais, cada vez mais, distante do amor.

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

Coisas que a gente não aprende na escola

Tem coisas que não têm nos livros, os professores não ensinam e os pais tentam nos alertar, mas estamos sempre tão preocupadas com nossas vidas que não nos damos contas de quão valiosos eram os alertas.
Só fora da escola aprendemos que os socos mais fortes não doem tanto quanto algumas palavras ditas para machucar, descobrimos que nada é pra sempre e que em algum momento perderemos algo ou alguém importante. Aprendemos a amar de diversas formas, mas só conhecemos uma maneira de deixar de amar, que é sofrendo.
A gente aprende fora da escola que não importa o quanto trabalhemos, estudemos, procuremos oportunidades e tentemos apressar o tempo, tudo acontece na hora certa, exatamente no momento em que deve acontecer.
Aprendemos também que ninguém é tão autossuficiente a ponto de não precisar da ajuda dos outros. Sobre ajuda, a gente descobre que muitas das vezes ela vem de onde menos esperamos.
A gente aprende que é inato ao ser humano o desejo de sempre querer mais, nunca estamos satisfeitos com tudo que somos e temos.
Hoje, eu aprendi, que a felicidade da vitória não é nem a metade da tristeza que sentimos quando somos magoados por quem amamos de verdade.
Aprendi também que tem coisas que a gente pede que aconteça, outras que a gente torce, umas que previmos,  algumas que batalhamos e trabalhamos muito e outras coisas que simplesmente acontecem, sem que você espere, sem que você pressinta. Surgem do nada com uma força imensa, de maneira avassaladora, dilacerante e definitiva.
O grande barato dessas coisas que a gente só aprende fora da escola, está na forma com que esse aprendizado se dá. Só aprendemos vivendo, passado por todas as felicidades e tristezas das descobertas.

Nunca receberemos diplomas por esse aprendizado, tão pouco teremos uma festa comemorativa devido a conclusão dos estudos. Este nosso curso só será concluído quando a vida deixar de habitar nossos corpos e nosso certificado será tudo aquilo que construímos, amizades, amores, desafetos, sorrisos, lágrimas, enfim, tudo que vivenciamos no decorrer de nossas vidas.